Estamos, enfim, voltando às casas com cara de casa?
- Aline Paiva
- 8 de ago. de 2023
- 3 min de leitura
A literatura, a música, as artes plásticas, a arquitetura, a moda, o audiovisual… existe uma lista enorme das maneiras pelas quais o ser humano se expressa, discute e reflete sobre as questões de seu tempo - e a decoração é uma delas.
Há uma intenção, um objetivo, uma mensagem passada por trás das escolhas que fazemos ao decorar a nossa casa, ainda que sejam guiadas pelo nosso subconsciente. E como todo movimento artístico (ou cultural, ou social), nós claramente percebemos ciclos e tendências no universo da decoração.
Após décadas (séculos, na realidade) de trabalhos artesanais, individuais e exclusivos, com riqueza impressionante de detalhes e ornamentos, ao longo do século XX, o mundo entrou da era do industrial, da automatização, da funcionalidade, do essencial. Ao transitarmos do Barroco, do Rococó, do Neoclássico, do Art Nouveaux, para o Modernismo, o Bauhaus, o Minimalismo, o Futurismo, me parece que os lares contemporâneos foram pouco a pouco se perdendo nos conceitos, se perdendo nos movimentos, perdendo sua essência.
Desde o ínicio dos anos 2000, as residências foram deixando para trás as cores, as texturas, os traços culturais, as histórias, a personalidade, o individual... dando espaço para uma busca por ambientes cada vez mais clean, homogêneos, sem muitas estampas, sem muita informação, sem muita margem para contemplar o belo, sem muita chance para o gracioso. Miramos no simples, mas acertamos o simplista.
A essa altura você deve estar começando a se sentir um tanto deprimido, e eu te garanto que não é a inteção desse texto... Então vamos às boas notícias!
Seja simplesmente por um movimento pendular de oposição ao estilo atual (assim como vemos a cada 20 anos na moda), seja por consequência de tudo o que vivemos desde 2020, e como fomos forçados a repensar a nossa relação com a casa e o uso dos espaços, parece que oficialmente entramos em uma novo momento no design de interiores - e a CASACOR São Paulo 2023 deixou isso bem claro.
Contextualizando, a CASACOR, que encerrou sua edição São Paulo 2023 no último domingo, é a maior e mais completa mostra de arquitetura, design de interiores e paisagismo das Américas. Na prática, assim como para a moda existem as "Fashion Weeks" , a mostra não tem a intenção de trazer ambientes “reproduzíveis na vida real”, mas sim explorar tendências, novas maneiras de usar e combinar elementos, de instigar, de provocar, de inspirar. E para mim, que sou grande amante e defensora das casas que carregam significado, história e personalidade, essa edição foi um feliz marco. Através dos materiais e dos objetos, os ambientes pareciam retomar uma decoração sensorial e afetiva, retomar as nossas conexões e as nossas origens, despertar os nossos sonhos e as nossas memórias.
Diferente das edições anteriores, os materiais naturais, as texturas, as cores e os objetos pessoais tomaram conta. Depois de anos, voltamos a ver ambientes exalando individualidade, personalidade, combinando o novo e o antigo. Estamos, enfim, voltando às casas com cara de casa?
Para um olhar desatento pode parecer um mero detalhe decorativo, mas para mim foi muito simbólico ver em destaque, por exemplo, uma máquina de escrever posicionada ao lado de um notebook de última geração - e se tivesse que chutar, diria que não foi por acaso.
No que diz respeito à nossa casa, parece que levamos certo tempo, mas afinal entendemos que na busca pelo essencial, pelo funcional, pelo prático e pelo atual não precisamos abrir mão daquilo que nos encanta, que nos representa, que nos acolhe, que nos define. Existe espaço para o moderno e para o tradicional, para as memórias e para os planos futuros, para o funcional e para o belo. É o tal do caminho do meio.

















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